segunda-feira, 14 de maio de 2018
Decadência
A pior coisa é aceitar que está envelhecendo, ficando velho, perdendo a juventude. O que se faz para fingir que não é o mesmo da mocidade, que as forças estão indo embora, que tudo vai ficando mais difícil não tem limites.
Quando mamãe fez cirurgia de catarata e olhou-se no espelho, ela disse que levou um susto com o que viu. Papai sorria satisfeito quando contava que na portaria do prédio da minha irmã, o porteiro pensou que ele fosse irmão dela. No filme Tudo a Ganhar a mãe da personagem principal diz que, quando se olha no espelho não se reconhece.
Estou chegando nessa fase. Velha metida a moça é alvo de pessoas que estão prontas para agredir gratuitamente. Sempre encontram uma forma para lembrar que a pessoa está velha. Nem que for indicando a fila dos velhos no supermercado. Ver os outros envelhecerem com saúde é uma tortura para quem cai pelas tabelas desde quando fez trinta anos.
Mas o pior é quando as forças físicas não são as mesmas. Eu fazia dez coisas ao mesmo tempo. Tinha um preparo físico que dispensava ajuda para isso ou aquilo. Um exemplo é quando estava grávida de oito meses do Marcus, o gás acabou e eu tive que levar o botijão no muque, escada acima porque o cara da revendedora não o fez. Para não discutir com ele, e percebendo que ele abusava por eu estar grávida e com o sorriso nos olhos, querendo colocar-me no meu lugar, peguei o botijão e levei escada acima.
Tive uma empregada muito frágil que procurava não limpar o chão da casa. Em uma manhã varri a casa toda, passei o pano com detergente e encerei. E, na boa, suando pra caramba porque o calor e a umidade é muita nesse lugar, mas não tive problema algum. Hoje, no máximo faço isso cômodo a cômodo.
Subir as escadas da Cidade Alta, em direção ao Forum, de dois em dois degraus era moleza, mesmo grávida. E sem resfolegar na chegada ao topo.
Hoje, faço minha caminhada e quando subo o morrinho aqui perto de casa ou as escadas da academia, tudo bem rápido mas degraus um a um, na terceira vez já coloco os bofes pela boca.
De manhã já levanto mais lentamente com vontade de ficar deitada, lendo ou dormitando. Ao levantar e ainda sentada na cama, preciso fazer ginástica com os pés porque podem ficar com fascite ou eu andar devagar até o aquecimento.
Vejo processos desde 1970 e guardava tudo na cabeça. Mesmo com os arquivos de sempre. Em um tempo em que não havia cópia xerox e as petições eram datilografadas com três cópias e papel carbono, as informações jurídicas estavam na capacidade de compra de livros e coletâneas de jurisprudências, a memória sempre foi um diferencial. Uma advogada, formada há pouco tempo, disse que tenho memória de elefante e eu fico pasma por ela não ter memória alguma. Mas sinto que preciso correr o alfabeto todo até lembrar-me de uma palavra ou outra.
Estou ficando velha e isso é a ponta do iceberg. Sinto minha cabeça esfumaçando, pinicando, alguma coisa está acontecendo. Mas o pior mesmo é achar que Elvis já era, está ultrapassado como figura masculina e já morreu há tempos demais.
Caramba ! Envelheci. Como dizia mamãe, estou muito decadente...
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4 comentários:
é difícil mesmo lidar com a passagem do tempo. ainda mais em uma sociedade que fala sempre em rejuvenescimento. parece pecado ter limitações. beijos, pedrita
Eu sempre perguntava: "Vó como a senhora está? " E ela respondia: "Estou ficando velha." Mas aí eu comentava: "Todos nós..."
Por último ela me perguntava a minha idade e eu falava. Aí ela finalizava: "Puxa... tudo isto?!... " E isso aconteceu nos últimos 10 anos de vida dela... Saudades ...
Estou ficando velha...
Olá, tudo bem? Realmente é difícil convivermos coma passagem do tempo. Quando se passa dos 35 anos, a situação fica evidente.. Bjs, Fabio www.blogfabiotv.blogspot.com.br
OLá!!! O ruim de fazer a cirurgia de catarata foi chegar em casa e ver minhas rugas e a sujeira da cozinha. Juliana tb achou isto. Concordo com tudo o que vc escreveu. A mente está mais rápida que o corpo. O jeito é baixar a guarda e
se adaptar. Bjs.
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